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TCG de bainha tendínea

Patrícia Martins e Souza - Dezembro de 2020


História clínica


Mulher de 69 anos notou tumoração no dedo médio, em crescimento nos últimos meses e prejudicando a mobilidade. Solicitada ressonância magnética (RM) do 3º dedo:


Figura 1 (a-c): Imagens de RM no plano transversal de proximal (1a) para distal (1c) nas ponderações DP com supressão de gordura (DP SG), T1 e T1 com supressão de gordura (T1 SG), antes e após a administração venosa de gadolínio (T1 SG Gd).


Figura 2 (a-c): Imagens de RM no plano coronal nas ponderações DP com supressão de gordura (DP SG), T1, T2 e T1 com supressão de gordura após a administração venosa de gadolínio (T1 SG Gd).


Figura 3 (a-c): Imagens consecutivas de RM no plano sagital de lateral (3a) para medial (3c) nas ponderações DP com supressão de gordura (DP SG), T1 e T1 com supressão de gordura após a administração venosa de gadolínio (T1 SG Gd).


Descrição dos achados


Figura 1 (a-c)’: Imagens de RM no plano transversal de proximal (1a') para distal (3c') nas ponderações DP com supressão de gordura (DP SG), T1 e T1 com supressão de gordura (T1 SG), antes e após a administração venosa de gadolínio (T1 SG Gd), com marcador cutâneo no local da tumoração palpável pela paciente (pontas de seta azul), mostrando lesão expansiva sólida na porção volar do 3º dedo (setas amarelas em 1a'), localizada proximalmente em situação radial aos tendões flexores (setas brancas), estendendo-se entre a cortical das falanges (F) proximal e média e os tendões flexores na linha média (setas vermelhas em 1b') até a porção volar ulnar do 3º dedo (setas laranjas em 1c'). A lesão tem pouca expressão na ponderação T1 SG, e o realce pelo contraste é discreto e predominantemente periférico nas porções radial (1a') e mediana (1c') e bem mais intenso na porção ulnar (1c').


Figura 2 (a-c)’: Imagens de RM no plano coronal nas ponderações DP com supressão de gordura (DP SG), T1, T2 e T1 com supressão de gordura após a administração venosa de gadolínio (T1 SG Gd) mostrando lesão expansiva sólida no plano da falange proximal (Fp) na porção volar do 3º dedo (setas amarelas em 2a'), estendendo-se entre a cortical das falanges proximal (Fp) e média (Fm) e os tendões flexores (setas brancas) na linha média (setas vermelhas em 2b'), até a porção volar ulnar no plano da falange média (setas laranjas 2c'), onde se observa a impregnação mais intensa pelo contraste.


Figura 3 (a-c)’: Imagens consecutivas de RM no plano sagital de lateral (3a') para medial (3c') nas ponderações DP com supressão de gordura (DP SG), T1 e T1 com supressão de gordura após a administração venosa de gadolínio (T1 SG Gd) mostrando lesão expansiva sólida (setas amarelas em 3a') no plano do marcador cutâneo (pontas de seta azul), estendendo-se entre a cortical das falanges proximal (Fp) e média (Fm) e os tendões flexores (setas brancas) na linha média (setas vermelhas em 3b'). Note que a lesão determina discreta erosão na cortical volar da cabeça da falange proximal (setas verdes em 3b'). Na porção mais distal a lesão estende-se à região volar (setas laranjas em 3c'), onde tem realce mais intenso pelo contraste.



Discussão


O tumor de células gigantes (TCG) tenossinovial se origina da sinóvia das articulações, bursae ou bainhas tendíneas, podendo, portanto, ter localização intra-articular, extra-articular ou ambas. Os sintomas mais comuns são aumento do volume, limitação do arco do movimento e dor articular.


Originalmente foi descrito como uma proliferação inflamatória não-neoplásica, mas estudos citogenéticos posteriores sustentam sua classificação atual de natureza neoplásica, caracterizada histologicamente pela presença de células mononucleares, células gigantes osteoclastos-like, células inflamatórias crônicas e macrófagos com depósitos de hemossiderina intra-celular. Foram descritos 2 subtipos que, embora histologicamente similares, apresentam características de imagem, tratamento e evolução clínica distintas:


Forma difusa – conhecida previamente como sinovite vilonodular pigmentada (SVNP), tem comportamento localmente agressivo e acomete grandes articulações (principalmente joelho, quadril, tornozelo e cotovelo). Apresenta-se mais comumente como uma massa intra-articular com padrão de crescimento infiltrativo, sem cápsula definida e com dimensões frequentemente superiores a 5 cm. O risco de recorrência / doença residual costuma ser elevado, com relatos de 14 a 67% após sinovectomia aberta e de 40 a 92% após sinovectomia artroscópica.


Forma localizada – conhecida como TCG de bainha tendínea, acomete as pequenas articulações das mãos e pés, e costuma ser descrita como a forma localizada da SVNP, apresentando-se geralmente como uma formação expansiva nodular relacionada a uma bainha tendínea e delimitada por uma cápsula fibrosa.

Na tabela 1 estão as características e diferenças principais entre os 2 subtipos do TCG tenossinovial:


Tabela 1: Características principais dos subtipos do TCG tenossinovial.



TCG tenossinovial localizado (TCG de bainha tendínea)


É o 2º tumor mais comum das mãos, ficando atrás apenas das lesões císticas. Pode estar localizado no nível do carpo, metacarpos ou falanges, sendo os locais mais comuns a porção radial dos dedos médio e indicador, com maior prevalência da face volar (2:1 em relação à dorsal).


Tipicamente se apresenta como uma formação expansiva sólida, com dimensões entre 0,5 e 4,0 cm, bem circunscrita, capsulada e com contorno lobulado. Pode cursar com erosão óssea em 14 a 50% dos casos e, embora raro, tem risco potencial de transformação maligna.


As radiografias podem demonstrar, além do aumento das partes moles, erosão ou remodelamento ósseo. A ultrassonografia costuma ser útil na diferenciação entre lesões císticas e sólidas e detecção de derrame articular e proliferação sinovial, mas o TCG de bainha tendínea não apresenta nenhuma característica que permita a diferenciação com outras lesões sólidas hipoecoicas. Da mesma forma, a tomografia computadorizada (TC) demonstra a formação expansiva com densidade de partes moles e eventual acometimento ósseo, mas o aspecto é semelhante a diversas outras alterações neoplásicas e não-neoplásicas.


A ressonância magnética (RM) é o método de imagem de escolha na avaliação dos tumores de partes moles. O TCG de bainha tendínea se apresenta tipicamente na ponderação T2 com sinal marcadamente reduzido resultante da atividade paramagnética da hemossiderina, achado que fica mais evidente com a técnica gradiente-eco (GRE), onde se observa o artefato conhecido como “blooming”, em que o foco de baixo sinal (que pode ser material metálico, calcificação ou hemossiderina) é maximizado em relação ao seu tamanho real e obscurece os tecidos adjacentes. Esse artefato geralmente prejudica as imagens, mas no caso da pesquisa dos depósitos de hemossiderina esse efeito é útil por facilitar a sua detecção. Na tabela 2 estão as características de sinal mais comuns nos TCG de bainha tendínea.

Tabela 2: Características de sinal mais comuns nos TCG de bainha tendínea.


Nesse caso, a lesão apresentava sinal heterogêneo em DP com supressão de gordura, intermediário em T1 e sem expressão em T1 com supressão de gordura e sinal predominantemente reduzido em T2. O realce pelo contraste foi variável, com áreas sem sinais de realce ou só com discreto realce periférico nas porções radial e central, e impregnação mais intensa na porção ulnar distal, demonstrando como o sinal pode ser variável.


O tratamento de escolha do TCG de bainha tendínea é a excisão cirúrgica, que apresenta risco de recorrência relativamente baixos (6%) em comparação com a forma difusa. Entretanto, existem características que devem ser descritas nos laudos por terem correlação com o risco de recorrência, lesão residual e pior prognóstico, como adjacência à cápsula articular, o acometimento intra-articular e o envolvimento de ligamentos, músculos, feixe neurovascular e/ou tendões.


O principal diagnóstico diferencial do TCG de bainha tendínea nas mãos é o fibroma da bainha tendínea (FBT). O diagnóstico pode ser difícil, já que as duas lesões apresentam a mesma localização típica e as características de sinal também são semelhantes, com ambas apresentando baixo sinal na ponderação T2, sendo que enquanto que no TCG ele é decorrente dos depósitos de hemossiderina, no fibroma ele é secundário às bandas de colágeno denso e o pouco conteúdo de prótons de hidrogênio. Na tabela 3 estão as principais diferenças entre o TCG e o FBT.


Tabela 3: Principais diferenças entre o TCG e o fibroma da bainha tendínea.


Alguns autores (Ge Y. e cols.) relataram que, embora exista sobreposição entre os achados, o padrão das áreas de baixo sinal na ponderação DP com supressão de gordura também pode ajudar na diferenciação entre o TCG e o fibroma de bainha tendínea, avaliando 42 tumores (figura 4).


Lesão homogênea – o hipossinal uniforme tende a ocorrer mais frequentemente no TCG de bainha tendínea, com o fibroma apresentando geralmente sinal mais heterogêneo.


Lesão heterogênea – nas lesões heterogêneas, os autores observaram alguns padrões distintos: linear (“stripes”) e desorganizado, que tendem a ocorrer mais nos fibromas, separado (aspecto lobulado, com separação entre as áreas de baixo sinal) e escamoso ou granular, que tendem a ocorrer mais no TCG de bainha tendínea.


Figura 4 (a-d): Imagem modificada de ‘Magnetic resonance imaging features of fibromas and giant cell tumors of the tendon sheath: differential diagnosis. Eur Radiol. 2019 Jul;29(7):3441-3449’, mostrando os padrões de baixo sinal na ponderação DP com supressão de gordura, em que os tipos linear (a) e desorganizado (b) tendem a ocorrer mais nos fibromas, enquanto que os tipos separado (c) e escamoso ou granular (d) são mais frequentes no TCG de bainha tendínea.


Muitas vezes os laudos são inespecíficos pela realização de protocolos incompletos, apenas com as sequências básicas da rotina - como também aconteceu neste caso, onde não foram realizadas sequências com a técnica GRE, nem de difusão :(


Nos casos de tumores nas partes moles das mãos devemos realizar sequências adicionais ponderadas em T2 sem supressão de gordura e, caso a suspeita seja TCG ou fibroma de bainha tendínea, com uso de técnica GRE. É também importante a realização de sequências de difusão com pelo menos 2 valores de B para cálculo do mapa ADC, com inclusão de valor de ‘b’ alto (geralmente entre 800 e 1000). Nos exames de mão, muitos serviços já administram contraste venoso de rotina, sendo que nos casos de tumor é fundamental termos o T1 com supressão de gordura pré-contraste, sequência que pode ser dispensável quando a indicação é trauma ou alteração inflamatória, mas é imprescindível nos casos de lesões expansivas. E, no caso dos tumores, é útil a realização de estudo dinâmico no plano transversal e termos sequências pós-contraste T1 com supressão de gordura tradicional nos demais planos (idealmente nos 3 planos, mas se não for possível em pelo menos 2 planos). Abaixo o protocolo sugerido, com destaque para as sequências que devem ser realizadas fora da rotina. Para mais informações sobre os protocolos de rotina visite a página PROTOCOLOS e baixe os arquivos completos em PDF.



Aproveite e assista também a reunião online da SBOT-RJ sobre "TUMORES BENIGNOS MAIS COMUNS NAS PARTES MOLES DO PUNHO E MÃO" que ocorreu em outubro/20 e está disponível no site da Sociedade.



Leitura Sugerida


Dundar A, Young JR, Wenger DE, Inwards CY, Broski SM. Unusual manifestations of diffuse-type tenosynovial giant cell tumor in two patients: importance of radiologic-pathologic correlation. Skeletal Radiol. 2020 Mar;49(3):483-489. doi: 10.1007/s00256-019-03325-7.


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