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Descrevendo um miojo


Esse texto foi inspirado em um post do perfil @portugueslegal, que fez um compilado de diferentes formas de descrever que alguém comeu um Miojo dependendo do estilo literário do escritor. O que isso tem a ver com a radiologia? Calma, só lendo até o final!


Se fosse Jorge Amado (adaptado do texto de Maisa SV):

"Rita andava ligeiro, balançando as cadeiras suadas, levando consigo a panela cheia de miojo. Os aromas do tempero se confundiam com o suor de Rita debaixo do sol da Bahia enquanto ela se dirigia ao terreiro de mãe Dadá, onde o soldado Vieira Simão Esteves lhe aguardava, já sonhando com aquele momento em que ambos se lambuzariam com a iguaria, longe dos olhares de pai Virgírio de Oxóssi, ocupado que estava com seus trabalhos".


Se fosse Ariano Suassuna (por Mariana Marinho):

"Já cansado dessa agonia de passa fome, come gororoba, passa fome, come gororoba, acabei por bem de engolir essa papa e torcer para não chegar tão cedo a hora de descomer."






Se fosse Agatha Christie:

"Vincent Trennington, depois de uma partida demasiadamente longa de bridge com Lady Mary, sentiu um aroma diferente vindo da cozinha. Lá, encontrou James, o mordomo, e Anne, a criada, que degustavam uma massa estranha, mas polidamente aceitou experimentar o prato exótico, derramando um pouco em seu terno de tweed. Por isso, não ouviu o grito de Sir Archibald em seus aposentos, mas conseguiu com esse álibi ser eliminado da lista dos suspeitos".


E se fosse um radiologista descrevendo o Miojo? Você reconhece algum desses estilos?


Se fosse aquele radiologista que não tem a menor noção do que está vendo, mas tenta "se virar" ( o que quer que isso signifique...):


"Formação quadrangular bem definida, com contorno algo ondulado, com múltiplas imagens alongadas agrupadas, algumas apresentando aparente solução de continuidade, apresentando invólucro semelhante a material que pode representar plástico. Há, de permeio, estrutura quadrangular menor móvel, localizada entre a face superior da imagem maior e o invólucro, mas com plano de clivagem bem definido entre elas, também de contorno bem definido, mas regular e liso, ambas de aspecto pouco específico nas imagens obtidas, sem sinais de invasão".


O radiologista que até sabe o que é, mas escolhe ser prolixo, chato e passar a impressão de inseguro e/ou enrolador...

"Imagem de limites bem definidos, sólida, com contorno ondulado, medindo 13,0 x 10,5 cm nos maiores eixos antes da administração de H2O fervente, compatível com alimento de predomínio carboidrático da linhagem das massas. A imagem apresenta aumento do volume e alteração da forma após a administração de água fervente, prejudicando a mensuração adequada ao método. Nota-se, ainda, imagem menor adjacente, medindo 4,5 x 3,5 cm contendo material de sinal marcadamente mais intenso que a imagem maior, sugestiva de tempero, que pode ter sabor semelhante ao da galinha caipira. Destaca-se que, após a sua incorporação, ocasiona mudança na coloração e no sabor da imagem maior amorfa no estado atual".



E se fosse um radiologista que não esquece que é médico:

"Macarrão instantâneo, porção individual, com sabor artificial de galinha caipira".


OBS: Produto processado, com alto teor de sódio e baixo valor nutritivo, sendo recomendável prosseguir com outra escolha alimentar."




Radiologistas não são escritores, logo não há necessidade de ter um estilo pessoal inconfundível, fundamental para um escritor de sucesso. No caso de quem confecciona relatórios técnicos, é muito mais uma questão de vaidade do que uma necessidade da profissão. Na verdade, não só é desnecessário, como pode fugir do propósito da profissão, que é ajudar o médico assistente a chegar ao diagnóstico e decidir qual o melhor tratamento e a conduta adequada para cada paciente. Muitos se perdem em descrições prolixas e confusas, que além de não ajudar, ainda podem atrapalhar, gerando dúvidas, novos exames e procedimentos desnecessários, podendo até mesmo em algumas situações chegar a ser constrangedor...


Qual estilo você prefere e qual você gostaria de adotar?

E qual estilo de laudo você gostaria de receber se estivesse no lugar do médico assistente?


Já refletiu sobre isso?







"Escrever bem é abotoar elegantemente o paletó do alfabeto".

Daniel Polcaro


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