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Lesão "GLAD"

História clínica

 

Homem, 48 anos, com dor persistente, principalmente anterior, sem história de luxação ou sintomas de instabilidade glenoumeral. Solicitada artrorressonância do ombro:


Figura 1 (a-b): Imagens consecutivas de artrorressonância na ponderação T1 com supressão de gordura (SG) no plano axial.


Figura 2 (a-b): Imagem de artrorressonância na ponderação T1 SG no plano em abdução e rotação externa (ABER).


Descrição dos achados:


Figura 1 (a-b)': Imagens consecutivas de artrorressonância na ponderação T1 SG no plano axial mostrando lesão no labrum posterior (seta branca) com pequeno cisto paralabral em correspondência (seta laranja) e lesão na cartilagem (seta amarela) adjacente ao labrum anteroinferior (seta azul), que tem sinal preservado.


Figura 2': Imagem de artrorressonância na ponderação T1 SG no plano ABER mostrando lesão na cartilagem (seta amarela) adjacente ao labrum anteroinferior (seta azul) que tem contiguidade com o complexo capsuloligamentar (setas verdes), sem sinais de destacamento. TSE – tendão supraespinhal.



Discussão:

 

As lesões do labrum anteroinferior estão geralmente associadas a luxação anterior traumática, com séries relatando prevalência de 84 a 100% após o primeiro episódio. A lesão clássica é conhecida como lesão de Bankart (avulsão do complexo labroligamentar anteroinferior com rotura do periósteo), que pode ser acompanhada de fratura por avulsão da margem anteroinferior da glenoide (lesão de Bankart óssea). Posteriormente foram descritas outras variantes, como a lesão de Perthes (avulsão do complexo labroligamentar anteroinferior com periósteo íntegro) e ALPSA (“Anterior Labroligamentous Periosteal Sleeve Avulsion”), onde há deslocamento medial do labrum.

 

A lesão GLAD ("GLenolabral Articular Disruption") é a lesão da cartilagem da porção anteroinferior da glenoide, conhecida também como lesão GARD ("GLenolabral Articular Rim Divot"), que pode se estender superficialmente ao labrum glenoide adjacente, mas sem sinais de destacamento. É causada pela adução forçada com o ombro em abdução e rotação externa, levando a dor anterior com testes de instabilidade anterior negativos, pois não há destacamento labral. A dor costuma ser aliviada após injeção intra-articular de anestésico. Pode estar associada a luxação anterior prévia ou queda, mas se não houver lesão de Bankart em associação o paciente não apresenta quadro clínico de instabilidade, apenas dor anterior.

 

É importante a distinção entre a lesão de Bankart e a lesão GLAD porque na lesão de Bankart é necessária a fixação do labrum destacado e na lesão GLAD o tratamento cirúrgico consiste no debridamento artroscópico da lesão labral superficial e condroplastia / abrasão do defeito condral na glenoide. Embora não associada diretamente com instabilidade, trabalhos recentes (J Pogorzelski e cols. J Shoulder Elbow Surg 2018 Aug;27(8):e235-42) têm demonstrado que nos casos de associação entre lesão de Bankart e lesão condral na glenoide (GLAD), a não abordagem da lesão da cartilagem pode cursar com instabilidade recorrente, o que aumenta a importância da detecção de lesão condral nos exames pré-operatórios.

 

Nem sempre a lesão GLAD tem expressão na ressonância magnética, ainda mais quando não há líquido articular, sendo indicada a artrorressonância nesses casos, idealmente com o posicionamento ABER (figuras 3 e 4).  

O posicionamento ABER deve fazer parte do protocolo de rotina da artrorressonância, pois muitas lesões podem ser subestimadas na RM convencional ou somente identificadas com o estresse da abdução, como:

- Lesões parciais articulares do manguito rotador

- Delaminação intrassubstancial com extensão para o infraespinhal

- Lesão de Bankart, principalmente na ausência de líquido articular

- Lesão de Perthes

- Lesão GLAD


Figura 3 (a-c): Imagens consecutivas de artrorressonância na ponderação T1 com SG no plano axial não demonstra alterações expressivas.


Figura 4 (a-c): Imagens consecutivas de artrorressonância na ponderação T1 SG no plano ABER do mesmo paciente da figura 3 mostrando lesão na cartilagem (setas amarelas) em contiguidade com o labrum anteroinferior que não era evidente nas imagens axiais em posição neutra. Note lesão parcial acometendo quase toda a espessura do tendão supraespinhal (setas vermelhas), caracterizada por insinuação do meio de contraste, achado que também só foi identificado no posicionamento ABER.



Pontos principais neste caso: 

- Incluir ABER sempre na rotina da artrorresonância.


- Os exames de ombro devem ter alta resolução espacial, que muitas vezes não é satisfatória pela prática de reduzir demais o tempo da aquisição das imagens. Esta prática não deve ser incentivada pelos radiologistas, uma vez que prejudica a avaliação de estruturas importantes, como a cartilagem e o labrum (figura 5).


Figura 5 (a-b): Imagens de RM em aparelhos de 1,5 tesla no plano axial. Na figura 5a as imagens apresentam boa resolução espacial, permitindo a adequada diferenciação entre o osso, a cartilagem, o labrum, que apresenta lesão no segmento posterior (seta amarela), e o líquido articular. Na figura 5b, apesar de não haver líquido articular significativo, é possível identificar também a lesão do labrum posterior (seta laranja), porém a detecção só foi possível porque a lesão é muito evidente e não há definição adequada da cartilagem.



LEITURA SUGERIDA

Failure following arthroscopic Bankart repair for traumatic anteroinferior instability of the shoulder: is a glenoid labral articular disruption (GLAD) lesion a risk factor for recurrent instability? Pogorzelski J, Fritz EM, Horan MP, Katthagen JC, Provencher MT, Millett PJ. J Shoulder Elbow Surg. 2018 Aug; 27(8):e235-e242. doi: 10.1016/j.jse.2018.02.055.

 

Advanced imaging of glenohumeral instability: the role of MRI and MDCT in providing what clinicians need to know. Demehri S, Hafezi-Nejad N, Fishman EK. Emerg Radiol. 2017 Feb; 24(1):95-103. doi: 10.1007/s10140-016-1429-7. Epub 2016 Aug 13. Review.

 

First-time shoulder dislocation: High prevalence of labral injury and age-related differences revealed by MR arthrography. Antonio GE, Griffith JF, Yu AB, Yung PS, Chan KM, Ahuja AT. J Magn Reson Imaging. 2007 Oct; 26(4):983-91.

 

Anterior shoulder instability: accuracy of MR arthrography in the classification of anteroinferior labroligamentous injuries. Waldt S, Burkart A, Imhoff AB, Bruegel M, Rummeny EJ, Woertler K. Radiology. 2005 Nov; 237(2):578-83.


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