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Livro ou artigo?



Na enquete que eu fiz no Instagram do site (@mskrad.com.br) perguntando as fontes mais utilizadas para aprendizado os livros ficaram em último lugar (com menos de 10%), os sites em primeiro e os artigos em empate técnico com Instagram e YouTube.


Outros dados que chamaram atenção foram a percepção subjetiva de 86% das pessoas que acham que atualmente estamos estudando menos e quase 70% disseram não saber bem as diferenças entre se estudar por livros, sites, artigos e redes sociais.


Livros

O livro foi durante muito tempo a única fonte de estudo. Quando surgiram os artigos, inicialmente o acesso não era assim tão fácil: as assinaturas eram (e ainda são) caras e a opção era a xerox, só que a cada cópia as imagens iam ficando cada vez piores, o que faz toda diferença na radiologia. E, com a internet e a opção do formato PDF, os artigos e outras fontes de informação foram substituído os livros e já vemos os reflexos disso com as livrarias médicas entrando em extinção.


E uma questão que muita gente ainda não pensou é que estamos entrando numa época em que há profissionais que no início da carreira estudaram por livros e foram substituindo por outras fontes de informação coexistindo com pessoas que nunca leram um livro de radiologia.


A grande vantagem do livro é que ele dá um panorama geral do assunto, o que é muito útil para quem ainda não sabe quase nada sobre o assunto. Por exemplo, um livro de ultrassonografia, antes de abordar as lesões, vai explicar a física do ultrassom, os transdutores, o posicionamento, as manobras e a anatomia ultrassonográfica. O livro do Donald Resnick organiza as diversas formas de apresentação das alterações musculoesqueléticas pela fisiopatologia, enquanto o livro do Stoller sugere um checklist sobre o que todos deveriam saber de protocolo, anatomia e ordem de avaliação de cada articulação por compartimentos.


Ou seja, os livros costumam ser grandes, mas ajudam muito no início da carreira quando estamos perdidos e sem saber por onde começar. Além disso, quando temos pouco conhecimento podemos cair em algumas armadilhas se estudarmos só por artigos, ainda mais se desconhece as particularidades de cada publicação:



Artigos

A definição de artigo científico segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas é “parte de uma publicação periódica com autoria declarada, que discute ideias, métodos, técnicas, processos e resultados em diversas áreas do conhecimento”.


Os artigos são mais curtos que os livros, o que atrai mais simpatia, já que parece que a pessoa vai conseguir ler um volume bem menor e com mais diversidade, enquanto no livro a sensação é a de que não vamos acabar nunca... Mas isso pode ser ilusório, já que os artigos são curtos porque abordam temas bem específicos, então para saber bem uma articulação vai ser necessário ler centenas de artigos!

Na área da saúde as publicações mais comuns são os artigos originais (publicação com dados inéditos já que seria a primeira vez que se faz uma pesquisa desse tipo), artigos de revisão (reúne as informações já publicadas em outros artigos; quando há uma análise estatística dos estudos encontrados é denominado metanálise), ensaios pictóricos (o objetivo é o ensino através de imagens e explicações principalmente por meio de legendas, com texto limitado e sem introduzir informações novas, sendo um formato muito utilizado nos posteres apresentados em congressos e jornadas científicas), notas técnicas (artigo curto fornecendo uma breve descrição de uma técnica, dispositivo, software ou procedimento novos, ou alguma modificação de algo já existente, e que deve apresentar um valor prático, contribuindo para o diagnóstico e/ou conduta) e os relatos de caso (relato de um caso raro, com apresentação atípica e/ou nunca descrito anteriormente).


Dentre esses artigos, as revisões com metanálise são as com maior evidência científica, já que analisam um grupo de estudos originais que segue metodologia similar e em condições experimentais controladas capazes de serem analisados estatisticamente e gerarem uma resposta que os artigos originais isoladamente não conseguem. Esses artigos são publicados em revistas de elevado fator de impacto e são frequentemente utilizados na elaboração ou atualização de diretrizes. Outro ponto importante é que os autores de artigos de revisão são geralmente convidados, o que faz com que sejam publicações mais confiáveis. Mas, como todo artigo, são textos bem focados em um assunto específico. Por exemplo, eu fui convidada para escrever um artigo em parceria com outras radiologistas sobre o diagnóstico diferencial das metatarsalgias (Afonso PD, Britto SV, Spritzer CE, Martins E Souza P. Differential Diagnosis of Metatarsalgia. Semin Musculoskelet Radiol. 2023 Jun;27(3):337-350. doi: 10.1055/s-0043-1764388. Epub 2023 May 25. PMID: 37230133.). Mesmo que no artigo tenha algum conteúdo de anatomia e questões técnicas, vai aproveitar muito mais quem tem alguma noção sobre ressonância magnética do pé do que uma pessoa que nunca estudou nada sobre o assunto e se deparou com um exame com indicação de metatarsalgia e está lendo sobre pé pela primeira vez. O mesmo ocorre sobre os ensaios pictóricos: ver um monte de imagens sem nenhum conhecimento teórico e técnico pode até confundir no dia a dia porque muitas imagens são parecidas. Os relatos de caso são artigos com baixa evidência científica, já que são observações em apenas um ou um pequeno grupo de pacientes, tanto que a maioria das revistas de alto impacto nem aceita esse tipo de publicação. Fora que, para quem tem pouco conhecimento, não tem muita serventia estudar um caso que provavelmente ele dificilmente vai encontrar na vida real. Os artigos originais são muito conceituados, já que são fruto de uma pesquisa científica inédita. Mas é importante saber analisar esse tipo de artigo com senso crítico, já que não é difícil um trabalho científico apresentar algum viés ou análise estatística inadequada. Logo, uma pessoa sem muito conhecimento na área deve ter cuidado em não tomar todo artigo científico como verdade absoluta – escolher revistas, instituições e autores conceituados já é um bom começo, mas mesmo assim o senso crítico é importante.

O que leva às demais fontes de conhecimento: se artigos científicos, que são previamente avaliados e aprovados por um comitê editorial de experts, podem ser passíveis de críticas, o que dizer de sites e redes sociais onde qualquer pessoa pode publicar o que quiser? Como saber se aquela informação é confiável? Ainda mais se a pessoa não tem tanto conhecimento assim para julgar.


O estudo precisa de várias reflexões: o que estudar em cada momento, de que forma, onde e com quem buscar as informações.



"O maior inimigo do conhecimento não é a ignorância, é a ilusão do conhecimento".

Stephen Hawking


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