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Forma & Conteúdo


O laudo radiológico possui basicamente dois componentes: o conteúdo, formado a partir do nosso conhecimento e experiência, o conjunto de informações que podemos fornecer a partir dos exames de imagem, e a forma, que significa como essas informações são transmitidas.

O laudo ideal é aquele que consegue fazer bom uso da semântica (o significado e os sentidos que as palavras podem tomar de acordo com o contexto) e da sintaxe (a maneira com que organizamos e relacionamos as palavras no texto) para emitir um relatório que auxilie o médico assistente a traçar a melhor conduta.

O foco das atividades de ensino costuma ser voltado quase que exclusivamente para o diagnóstico, dando-se pouca importância ao ensinamento sobre a melhor forma de transmiti-lo. Mas, tão importante quanto fazermos o diagnóstico, é conseguir passar as informações de forma adequada.


No artigo “How to Create a Great Radiology Report” (RadioGraphics 2020; 40:1658–1670) os autores colocam que o aprendizado da “a arte do laudo” acaba ocorrendo de forma passiva, inconsistente e subconsciente, através da imitação do estilo de outros radiologistas. E isso tem sido agravado a medida em que as revisões de laudo tem se tornado cada vez menos frequentes e as interações entre os profissionais mais esporádicas. A falta de feedback faz com que os laudos não sejam aprimorados e os médicos tenham uma percepção benevolente dos seus relatórios, acreditando que eles são melhores do que realmente são, mesmo entre os que estão na fase de treinamento. A seguir estão alguns pontos onde podemos melhorar a forma do laudo para que ela não prejudique a transmissão do conteúdo:

- ‘Menos é mais”

Tendemos a descrever as alterações na ordem em que formamos nosso raciocínio, quando deveríamos primeiro organizar as ideias para, só depois, vermos como descrever de forma clara e sucinta, sem redundâncias. Como foi bem colocado na famosa frase do escritor Mark Twain - “I didn’t have time to write a short letter, so I wrote a long one instead.”, fazer relatórios sucintos costuma no início ser mais trabalhoso do que simplesmente sair escrevendo da forma como o texto vem à cabeça. Mas é um esforço que vale a pena! Com a prática, escrever de forma mais enxuta se torna natural e cada vez mais rápido. Além disso, quanto mais se escreve mais se aumenta a chance de errar e do médico assistente se confundir com o texto ou até mesmo nem se dar ao trabalho de ler o laudo... Uma forma de nos desapegarmos de certas frases é sempre se perguntar: se determinada palavra for suprimida o sentido mudaria ou o entendimento seria mais difícil? Se a palavra não acrescenta nada, simplesmente retire-a do texto!

- Curto, porém completo

Ser sucinto não significa confeccionar um laudo telegráfico, desprovido de detalhes e com informações soltas. Como já foi abordado no texto “Livro x filme” postado em março de 2019, um dos princípios do laudo radiológico, conforme defendido por Munn é que “Devemos descrever os achados de forma que alguém que não veja as imagens consiga desenhar a imagem baseando-se apenas nas nossas palavras”. Descrever apenas “derrame articular”, por exemplo, não dá a ideia de quantidade, podendo significar desde um derrame discreto até um volumoso que necessita de punção articular. O laudo tem que ser rico em detalhes e limpo de palavras que não agregam significado relevante.

- Qualquer médico vai entender?

Devemos evitar jargões radiológicos e termos técnicos que não são familiares às outras especialidades. Qual a sua reação ao ler um laudo histopatológico com “proliferação de tecido linfoide com células com núcleos redondos não clivados com mínimo pleomorfismo e nucléolos inconspícuos, com células histiocitárias de citoplasma amplo de permeio, com aspecto característico de ‘céu estrelado’". Esse é o tipo de relato que só outro patologista entenderia como uma descrição de linfoma não-Hodgkin. Precisamos entender para quem é o laudo. É importante que fique claro para outros radiologistas que vão rever e/ou fazer um controle evolutivo no futuro, mas o foco principal é o entendimento dos médicos assistentes que não são radiologistas e não tem obrigação de saber a terminologia específica da especialidade, como “T2 longo”, “dupla fenda”, “alto sinal em DP”, etc. Reflita que, na prática, quem não é radiologista não entende e o radiologista que vai analisar as imagens não precisa dessas informações.

- Lembre dos questionamentos fundamentais de todo laudo:

  • O que eu vejo nas imagens?

  • O que eu acho que essas imagens significam?

  • O que eu gostaria que o médico solicitante concluísse com o laudo - os achados são relevantes ou sem importância? Descrevem um diagnóstico (como fratura, rotura tendínea, tumor, etc.)?

  • O que eu acho que o médico assistente deve fazer em seguida? – considerar cirurgia? Fazer controle evolutivo ou biópsia?

Um exemplo prático formulando essas perguntas e comparando duas formas de descrever uma RM de joelho de um paciente que sofreu trauma durante jogo de futebol apresentando dor e instabilidade (quadro 1).


Quadro 1: Exemplos de duas formas de descrever o edema ósseo contusional e a rotura do ligamento cruzado anterior (LCA) e como ambas respondem os questionamentos fundamentais do laudo e influenciam o entendimento do médico assistente (MA).


Note que a forma de descrição mais prolixa não acrescenta nenhuma informação a mais que a descrição mais sucinta, e em vez de responder aos questionamentos de forma conclusiva, pode deixar dúvidas para o médico assistente.


"O que é mais difícil não é escrever muito; é dizer tudo, escrevendo pouco".

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