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Luxação Traumática Aguda da Patela com Fratura Osteocondral

História clínica

 

Paciente do sexo feminino, 13 anos, com dor e aumento do volume no joelho após torção durante atividade física realizou estudo por ressonância magnética (RM).


Figura 1 (a-f): Imagens consecutivas de RM no plano axial na ponderação T2 com supressão de gordura.






































Descrição dos achados


Figura 1 (a-f)’: Imagens consecutivas de RM no plano axial na ponderação T2 com supressão de gordura mostrando edema na margem medial da patela com lesão da cartilagem em correspondência (setas brancas), edema ao longo da margem externa do côndilo femoral lateral (setas vermelhas), derrame articular e fragmento osteocondral destacado no recesso articular lateral (setas amarelas).





Figura 2’: Imagem de RM no plano axial na ponderação DP mostrando o local da origem do destacamento osteocondral (seta branca) e nível líquido-líquido no derrame articular característico de hemartrose (setas azuis).



























Figura 3 (a-f)’: Imagens de RM no plano coronal mostrando nas diferentes ponderações o local do destacamento osteocondral (setas brancas) com edema ósseo em correspondência identificado na sequência sensível a líquido (3a) na porção inferomedial da patela. No plano dos côndilos femorais também se identifica edema ósseo periférico (setas vermelhas) e o fragmento osteocondral destacado no recesso articular lateral (setas amarelas).


















Figura 4 (a-b)’: Imagens de RM no plano sagital na ponderação T2 no plano do centro da articulação femoropatelar (4a’), que não evidencia alterações relevantes na anatomia femoropatelar e no plano do côndilo femoral lateral (4b’) mostrando a hemartrose (seta azul).



Discussão

 

A patela em extensão e nos graus iniciais de flexão (< 30°) encontra-se em posição superolateral à tróclea femoral, mais susceptível a deslocamento. Embora a luxação possa ocorrer em qualquer pessoa ativa, existem fatores anatômicos relacionados à instabilidade femoropatelar, como displasia troclear, patela alta e/ou com inclinação lateral excessiva e aumento da distância entre o fundo da tróclea e a tuberosidade tibial, além de hipoplasia do vasto medial, frouxidão ligamentar, aumento da anteversão femoral e torção externa da tíbia, o que faz com que mesmo movimentos cotidianos sejam suficientes para promover o deslocamento lateral da patela. Porém, mesmo indivíduos com configuração femoropatelar normal podem apresentar episódio de luxação transitória caso força suficiente seja exercida sobre a patela quando ela está mais vulnerável ao deslocamento, o que também aumenta o risco de fratura osteocondral decorrente da violência do impacto entre a patela e o fêmur (presente em cerca de 25% dos casos).

 

Mecanismo da luxação lateral da patela – o evento típico é torção com o joelho pouco fletido, com o fêmur rodado internamente em relação à tíbia fixa. A patela é deslocada lateralmente, com estiramento das estruturas ligamentares do compartimento patelofemoral medial (estruturas do retináculo medial), frequentemente causando a queda do paciente que, na sequência, estende o joelho. Com o joelho em extensão há redução da luxação, com retorno da patela à sua posição inicial. Na fase da redução ocorre impacto entre a margem inferomedial da patela e a face externa da porção anterior do côndilo femoral lateral, gerando o padrão de edema característico e virtualmente patognomônico da luxação lateral transitória da patela (figura 5). Como este evento costuma ser muito rápido, não é infrequente o paciente não perceber o episódio de luxação (o que pode ocorrer em mais de 50% dos casos), sendo fundamental o reconhecimento deste padrão de edema nas imagens de ressonância magnética.


Figura 5 (a-d): Representação esquemática no plano axial mostrando as diversas fases do deslocamento transitório da patela: após a aplicação de vetor de força lateral (seta vermelha em 5a), a patela sofre deslocamento lateral (5b), com estiramento das estruturas do retináculo medial (em verde). Na fase de redução (5c) ocorre impacto entre as margens inferomedial da patela e lateral do côndilo femoral. Após a redução (5d), com a patela já em sua posição habitual, permanece o edema ósseo característico (áreas em vermelho).




Nos pacientes com luxação lateral transitória da patela é muito importante reconhecer as alterações concomitantes, como a fratura osteocondral que pode estar presente em 25% dos casos após a luxação aguda traumática e costuma ter indicação cirúrgica.



A superfície articular convexa da patela a torna vulnerável a lesão da cartilagem tanto nas fases de deslocamento quanto de redução. Na fase do deslocamento há impacto tangencial entre a patela e a superfície articular da área de carga do côndilo femoral lateral, o que pode levar a lesão da cartilagem na patela, no côndilo femoral ou ambos. Na fase de redução, há impacto tangencial entre o polo inferomedial da patela e a face lateral não articular do côndilo femoral lateral, causando o edema ósseo típico e também predispondo a lesão osteocondral na patela. Como o edema ósseo no fêmur ocorre na fase de redução, ele costuma ser anterior ao local da lesão condral. A porção central da tróclea femoral tem superfície articular côncava, sendo mais rara a lesão condral decorrente da luxação da patela nesta região.

 

Na luxação aguda traumática é comum a presença de hemartrose (é a 2ª causa de hemartrose no joelho), sendo frequente a lesão das estruturas do retináculo medial e as fraturas osteocondrais associadas. A recorrência é alta, estimada em cerca de 40% dos casos.

 

Uma das indicações de abordagem cirúrgica no tratamento os pacientes que apresentaram luxação lateral transitória da patela é a presença de fratura osteocondral. Nem sempre sua detecção é fácil, principalmente na ausência de derrame articular, devendo o radiologista ter alto índice de suspeição e buscar ativamente o fragmento osteocondral destacado em todos os planos (figuras 6 a 8).

O fragmento pode ser identificado nas radiografias específicas para avaliação da patela e foi descrito por Haas e cols. em 2012 como o “sinal da lasca” (“sliver sign”), definido como imagem linear ou curvilínea com densidade óssea, podendo ser considerado um sinal de episódio de luxação transitória aguda da patela já que sua configuração é bem típica. A porção óssea do fragmento com sua configuração típica pode também ser identificada nas imagens tomográficas (figura 9).


Figura 6 (a-c): Imagens de RM outro paciente com episódio de luxação traumática transitória da patela. No plano axial na ponderação T2 com supressão de gordura (6a) nota-se edema na margem medial da patela (seta branca) com fratura osteocondral em correspondência (seta amarela), edema ao longo da margem externa do côndilo femoral lateral (seta vermelha) e derrame articular com fragmento osteocondral destacado de permeio (seta preta). No plano sagital na ponderação T2 também é possível identificar o local da fratura osteocondral (seta amarela em 6b) e o fragmento osteocondral destacado (seta preta em 6c).


Figura 7 (a-b): Imagens de RM de outro paciente com episódio de luxação traumática transitória da patela na ponderação DP com supressão de gordura. Plano axial (7a) mostrando edema ao longo da margem externa do côndilo femoral lateral (seta vermelha) e, mais discreto, na margem medial da patela (seta branca). Na imagem no plano coronal (7b) é possível identificar melhor o fragmento osteocondral destacado (seta amarela), originário da área de carga do côndilo femoral lateral.


Figura 8(a-c): Imagens de RM de outro paciente com episódio de luxação traumática transitória da patela. Plano axial na ponderação T2 com supressão de gordura (8a) mostrando edema ao longo da margem externa do côndilo femoral lateral (seta vermelha) e na margem medial da patela (seta branca) com fratura osteocondral em correspondência (seta amarela larga). Nas imagens no plano sagital nas ponderações DP com supressão de gordura (8b) e T2 (8c) foi possível identificar o local da fratura osteocondral (seta amarela larga em 8c) e o fragmento osteocondral destacado (setas amarelas finas) na interlinha articular anterior.


Figura 9 (a-b): Reconstruções tomográficas em MPR no plano axial (9a) e sagital (9b) de outro paciente com episódio de luxação traumática transitória da patela mostrando bem a porção óssea do fragmento osteocondral destacado (setas amarelas finas) com a configuração tipicamente linear.



Leitura sugerida

 

Petri M, Ettinger M, Stuebig T, Brand S, Krettek C, Jagodzinski M, Omar M.Current Concepts for Patellar Dislocation. Arch Trauma Res. 2015 Sep 1;4(3):e29301. doi: 10.5812/atr.29301.

 

Dejour DH. The patellofemoral joint and its historical roots: the Lyon School of Knee Surgery. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc 2013 Jul; 21(7):1482–1494.

 

Tsai et al. Primary traumatic patellar dislocation. Journal of Orthopaedic Surgery and Research 2012, 7:21.

 

Haas JPCollins MSStuart MJ. The “sliver sign”: a specific radiographic sign of acute lateral patellar dislocation. Skeletal Radiol 2012; 41:595–601.

 

Diederichs G, Issever Ahi S, Scheffler S. MR Imaging of Patellar Instability: Injury Patterns and Assessment of Risk Factors. RadioGraphics 2010; 30: 961-981.

 

Fithian DC, Neyret P, Servien E. Patellar instability: the lyon experience. Techniques in Knee Surgery. 2007;6(2):112-123.

 

Escala JS, Mellado JM, Olona M, Giné J, Saurí A, Neyret P. Objective patellar instability: MR-based quantitative assessment of potentially associated anatomical features. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2006 Mar;14(3):264–272.

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