O influenciador digital, conhecido como “influencer”, é definido como alguém capaz de influenciar as decisões e comportamento das pessoas através da sua produção de conteúdo nas redes sociais. Mas não são apenas essas pessoas com o poder de influenciar as demais, muito pelo contrário. No dia a dia também influenciamos quem convive conosco no ambiente de trabalho e somos igualmente influenciados. Por isso, devemos ter cuidado com determinados discursos, pois, seja de forma direta ou por meio de mensagens subliminares, eles acabam por afetar as atitudes de outros profissionais, principalmente os que estão no início da sua formação e os trabalham diretamente conosco. Ao cobrarmos constantemente de um operador de RM que ele "acelere" um exame por conta de algum atraso, estamos contribuindo com a ideia de que o que se espera dele é fazer exames rápidos, por exemplo, o que será propagado para os outros profissionais que serão influenciados por essa pessoa.
No post do mês anterior vimos que a propagação de afirmações parciais, como a de que a ressonância magnética da coluna é um exame “fácil, rápido e simples”, como se fosse uma verdade absoluta não é livre de consequências: aumenta a chance de erros diagnósticos, conforme já discutido no blog "A cegueira involuntária", atrasa a atualização e inserção de sequências adicionais nos protocolos, que ficam presos a conceitos do passado e gera as "corridas malucas".
Esse assunto gerou bastante interesse e muitos responderam às enquetes no Instagram (@mskrad.med) que confirmaram a impressão subjetiva que temos no dia a dia:
A maioria costuma ouvir com frequência afirmações que colocam a coluna como um exame mais simples que os demais, como "é só uma coluninha", "coluna é exame para tirar atraso", que não precisa de muitas sequências, "quase tudo é resolvido com o sagital e o transversal T2", etc.
Mas, ao perguntar a opinião sobre esse tipo de discurso, se é muito nocivo, se são só afirmações de brincadeira que não devem ser levadas a sério ou se são verdade, o resultado foi o seguinte: só 8% responderam achar realmente que essas afirmações são verdadeiras, enquanto que 42% acharam essas afirmações muito nocivas. Mas 50% acharam que essas afirmações não devem ser levadas a sério e, de fato, vejo muitos falando assim em tom de brincadeira ou provocação.
A questão é que, mesmo quando não é a intenção, qualquer afirmação, mesmo as em tom de "brincadeira", tem o poder de influenciar outras pessoas, conforme vimos nas outras perguntas:
82% dos que participaram afirmaram que acontecem as corridas por determinados exames. E, em grande parte dos locais onde isso não ocorre, é porque foram criados mecanismos externos para evitar esse tipo de comportamento.
E a RM da coluna está entre esses exames que somem bem rápido da lista, justamente por serem considerados exames simples, com bom custo-benefício, enquanto outros exames ficam para trás - justamente os que não são alvo desse tipo de discurso.
Da mesma forma, na pergunta referente à qual exame o radiologista tinha mais segurança no início da sua formação, a coluna lombar ficou muito à frente da angiografia da aorta e artérias ilíacas, por exemplo, com 89% dos votos.
E isso se reflete no que vemos no dia a dia das listas de trabalho: é muito mais frequente os exames de coluna lombar serem vistos logo, mesmo por radiologistas no início da carreira, enquanto que outros ficam para trás.
Essas afirmações afetam o comportamento dos radiologistas de várias formas. De tanto ouvir falar que alguns exames são simples, por exclusão começamos a achar que outros são super complexos, devendo ser evitados, como é o caso das angios. Mas, sendo racionais, de que forma um exame de coluna seria menos complexo e arriscado em comparação com uma angio de aorta para excluir um aneurisma? Ou seja, a análise racional e individual de fácil x difícil é substituída por repetição de um discurso equivocado, ocorrem distorções no fluxo de trabalho e remuneração de determinados exames, o aprendizado fica comprometido, ou porque o radiologista acha que não precisa estudar ou de dedicar tanto a determinados assuntos ou segmentos por serem fáceis, ou que nem vale a pena correr atrás de outros por ser difíceis demais.
"Meias verdades são mentiras inteiras.."
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