top of page

OSTEÍTE PÚBICA

Patrícia Martins e Souza - Julho de 2020


História clínica

Homem, 25 anos, com dor crônica na região inguinal esquerda com irradiação para a porção interna da coxa proximal. Joga futebol regularmente, pelo menos 3 vezes por semana. Solicitada ressonância magnética (RM) da sínfise púbica:


Figura 1 (a-j): Imagens consecutivas de RM no plano transversal oblíquo da sínfise púbica nas ponderações DP com supressão de gordura (à esquerda) e T1 (à direita).


Figura 2 (a-e): Imagens de RM no plano coronal oblíquo da sínfise púbica na ponderação DP com supressão de gordura.


Figura 3 (a-f): Imagens consecutivas de RM no plano sagital na ponderação DP com supressão de gordura da direita (3a-c) para a esquerda (3d-f).

Descrição dos achados


Figura 1 (a-j)’: Imagens consecutivas de RM no plano transversal oblíquo da sínfise púbica nas ponderações DP com supressão de gordura (à esquerda) e T1 (à direita) mostrando extenso edema ósseo no púbis bilateralmente, caracterizado por hipersinal na sequência sensível a líquido (setas brancas) e baixo sinal em T1 (setas verdes). Há imagem linear de baixo sinal de permeio ao edema à esquerda (seta amarela nas imagens 1b’ a 1d’) que pode representar traço de fratura. Em T1 há indefinição cortical na margem articular em correspondência (seta laranja nas imagens 1b’ a 1d’). Nota-se lâmina líquida na sínfise púbica (seta azul nas imagens 1d’ a 1f’) e imagem linear de alto sinal margeando a inserção dos adutores à esquerda (seta vermelha nas imagens 1f’ e 1g’) e leve edema nas fibras justainsercionais do músculo adutor magno (setas rosas nas imagens 1e’ a 1j’). O ventre muscular do adutor magno é mais bem individualizado na ponderação T1 (asterisco amarelo nas imagens 1f’ a 1j’). Clique na seta para passar as imagens.


Figura 2 (a-e)’: Imagens de RM no plano coronal oblíquo da sínfise púbica na ponderação DP com supressão de gordura mostrando o edema ósseo no púbis bilateralmente (setas brancas) e a imagem linear de baixo sinal de permeio ao edema à esquerda (seta amarela). É também possível identificar a lâmina líquida na sínfise púbica (setas azuis), assim como a imagem linear de alto sinal margeando a inserção dos adutores à esquerda (seta vermelha) e o leve edema nas fibras justainsercionais do músculo adutor magno (setas rosas).


Figura 3 (a-f)’: Imagens consecutivas de RM no plano sagital na ponderação DP com supressão de gordura da direita (3a-c) para a esquerda (3d-f) mostrando o edema ósseo no púbis bilateralmente (setas brancas) e discreto hipersinal na inserção do adutor longo à direita (seta azul) e à esquerda (seta verde). É também possível identificar o leve edema nas fibras justainsercionais do músculo adutor magno esquerdo (seta rosa).


Discussão

Para o estudo da sínfise púbica o ideal é a realização de protocolo específico dedicado à região, com espessura e FOV menores em comparação com o estudo da bacia. Dessa forma, é possível também obter imagens com angulação no eixo do púbis, o que propicia melhor avaliação das estruturas anatômicas, principalmente a musculatura adutora. Para melhor orientação sobre o protocolo sugerido para os exames da sínfise púbica veja a página PROTOCOLOS / BACIA & QUADRIL. A musculatura adutora, melhor identificada no plano transversal oblíquo da sínfise púbica, também está disponível na página ANATOMIA / BACIA & QUADRIL.

Uma fonte de confusão que costuma ocorrer com as imagens oblíquas é a identificação dos planos transversal e coronal, uma vez que o que é identificado como transversal da sínfise fornece imagens que com aspecto de coronal e vice-versa. Uma das formas de evitar erros de comunicação é se referir como plano no eixo longo da sínfise para o coronal oblíquo e perpendicular ao eixo longo da sínfise para o transversal oblíquo (figura 4).



Figura 4 (a-d): Imagens de RM mostrando a marcação dos planos transversal e coronal oblíquo a partir do plano sagital. A marcação do plano transversal oblíquo (4a) é feita usando como referência uma linha perpendicular ao eixo longo da sínfise púbica (linha tracejada vermelha). A imagem obtida (4b) é a que melhor dissocia a musculatura adjacente, mas o aspecto se assemelha mais ao plano coronal. A marcação do plano coronal oblíquo (4c) é feita usando como referência uma linha no eixo longo da sínfise púbica (linha tracejada amarela). O aspecto da imagem obtida (4d) se assemelha mais ao plano transversal.


As principais indicações da realização de estudo dedicado da sínfise púbica são a suspeita de alterações localizadas na sínfise e atletas com dor na região inguinal.

O canal inguinal (figura 5) é um túnel que apresenta trajeto oblíquo de posterolateral superiormente a anteromedial inferiormente, contendo gordura, vasos e fibras nervosas e, nos homens, o cordão espermático e, nas mulheres, o ligamento redondo. É delimitado pelas fáscias de 3 músculos da parede abdominal anterior: os oblíquos externo e interno e o transverso abdominal.

Os limites do canal inguinal são:

  • Anterior - aponeurose do músculo oblíquo externo, que se divide distalmente e medialmente próximo à inserção no tubérculo púbico para formar o anel inguinal externo (= superficial).

  • Superior (teto) - músculos oblíquo interno e transverso abdominal

  • Posterior - fáscia transversal e tendão conjunto (formado pela junção do oblíquo interno com a fáscia transversal). A parede posterior recebe reforço adicional de fibras mais inferiores do oblíquo interno e transverso abdominal medialmente. Um defeito na fáscia transversal forma o anel inguinal interno (= profundo), localizado acima do ligamento inguinal e lateral e posterior aos vasos epigástricos inferiores.

  • Inferior (assoalho) - ligamento inguinal (= ligamento de Poupart), formado por fibras condensadas da aponeurose do oblíquo externo e que se estende da crista ilíaca anterossuperior ao tubérculo púbico.

Figura 5: Representação esquemática do canal inguinal e as estruturas relacionadas. Modificado de https://www.kenhub.com/.


A dor na região inguinal é comum na prática clínica e pode ter diversas etiologias (tabelas 1 e 2):


Tabela 1: Exemplos de causas gerais que podem cursar com dor na região inguinal.



Tabela 2: Exemplos de causas musculoesqueléticas que podem cursar com dor na região inguinal.

A dor inguinal no atleta é muito frequente, principalmente nos que participam de esportes que envolvem chutes, mudanças bruscas de direção, torção forçada do tronco, paradas e arrancadas súbitas, como no futebol. Pode correr também, menos frequentemente, em corredores de longa distância, tenistas e esportes menos comuns no nosso meio como hóquei e futebol americano. Os sintomas podem ser agudos, no caso de roturas miotendíneas traumáticas, ou crônicos. É estimado que cerca de 8 a 25% das lesões relacionadas ao esporte cursam com dor inguinal, podendo esta incidência ser ainda maior nos jogadores de futebol, chegando a até 58%. É bem mais frequente em homens, mas a incidência nas mulheres vem aumentando em decorrência de sua maior participação desportiva.

Como a dor crônica se assemelha à da hérnia inguinal, durante muito tempo essa condição ficou conhecida como “hérnia do esporte” (“sports hernia”), pois se acreditava que poderia ser decorrente de lesões ou hérnias ao longo do canal inguinal. Entretanto, diversos trabalhos concluíram que a hérnia inguinal é uma causa muito rara de dor nessa população atlética e, com isso, diversos termos foram empregados para descrever esse quadro clínico, como “pubalgia do atleta” e “disfunção dos adutores”, uma vez que eram frequentemente encontradas alterações relacionadas à sínfise púbica e nas partes moles adjacentes.

Em 2014 foi realizada em Doha (Qatar) a 1ª Conferência Mundial sobre Dor Inguinal em Atletas com o objetivo de unificar a terminologia e caracterizar sua etiologia. Nesse consenso, a dor inguinal nos atletas foi dividida em 3 categorias: origem nos adutores, iliopsoas, canal inguinal (sem hérnia palpável) e/ou púbis, origem no quadril e outras causas (figura 6).



Figura 6: Imagem de RM da bacia na ponderação T1 ilustrando as categorias de dor inguinal no atleta. Na categoria 1 estariam reunidas as causas relacionadas aos adutores, iliopsoas, canal inguinal e púbis. Na categoria 2 estariam incluídas as causas de dor originadas no quadril e a categoria 3 seriam as demais causas de dor inguinal.

Recentemente, foi publicado na revista Skeletal Radiol (Jun 2020) um glossário de termos em radiologia musculoesquelética que recomenda que o termo “dor inguinal” (“groin pain”) substitua os demais termos utilizados até então, como “pubalgia do atleta” e “hérnias do esporte, do atleta ou do futebol”, e seja utilizada apenas para descrever as alterações que foram englobadas na síndrome da dor inguinal no atleta: alterações na sínfise púbica, reto abdominal distal, adutores e fáscia inguinal, desconsiderando a dor causada por outras etiologias gerais ou musculoesqueléticas.


Dor inguinal no atleta relacionada à sínfise púbica

Alterações no osso púbico são frequentes em atletas sintomáticos e assintomáticos – estima-se que praticamente todos os jogadores de futebol profissional apresentarão alguma alteração na sínfise púbica em exames de imagem dedicados.

A osteíte púbica (ou sinfisite púbica) é descrita como uma alteração inflamatória que acomete a sínfise púbica e suas estruturas de suporte, sendo uma das causas da síndrome da dor inguinal no atleta.

A etiologia da osteíte púbica no atleta ainda não é completamente compreendida, mas se acredita que resulte de sobrecarga mecânica crônica (estresse repetitivo) sobre a sínfise púbica pelos músculos adutores e o reto abdominal, que se inserem no púbis e funcionam como antagonistas. Um desequilíbrio entre estes músculos pode amplificar o estresse e o microtrauma repetitivo, alterando a biomecânica da sínfise púbica. Surge um círculo vicioso, com repetidas lesões por cisalhamento e distração, levando a degeneração do disco fibrocartilaginoso e instabilidade articular, contribuindo para a osteíte e periostite e progressão para alterações degenerativas.

A dor é descrita como profunda e intensa, localizada no tubérculo púbico e região inguinal, que ocorre principalmente durante o exercício, geralmente de início insidioso e unilateral, mas podendo ser bilateral, e que costuma irradiar para o compartimento adutor da coxa, períneo e/ou bolsa escrotal. A dor piora na adução do quadril e exercícios abdominais contra resistência e está também associada a redução da amplitude da rotação interna e externa do quadril. A resolução da dor da osteíte púbica costuma levar cerca de 1 ano e frequentemente é recorrente, o que tem muito impacto no treinamento e na participação de eventos competitivos no caso dos atletas profissionais, podendo levar até ao término prematuro da carreira.

Os sintomas semelhantes ao das hérnias inguinais podem ser explicados pela proximidade das lesões com a margem medial do canal inguinal externo (superficial) ou pela extensão da lesão através do canal inguinal interno resultando em fraqueza na parede posterior do canal inguinal.


Anatomia da sínfise púbica

O osso pélvico ou da bacia (figura 7), também conhecido como osso inominado, funciona como um arco, transferindo o peso do tronco para o sacro e os quadris. É formado por 3 ossos de cada lado separados pela cartilagem trirradiada até a sua fusão, em torno de 15 aos 17 anos de idade:

Ílio – osso maior e mais largo, localizado superiormente. O corpo do ílio forma o teto do acetábulo e se expande para formar a asa. A asa do ilíaco apresenta uma margem superior espessa (a crista ilíaca, que se estende da espinha ilíaca anterossuperior até a espinha ilíaca posterossuperior), uma superfície interna côncava, a fossa ilíaca, de onde se origina o músculo ilíaco, e uma superfície externa convexa onde se localiza a musculatura glútea.

Ísquio – forma a parte posteroinferior da bacia e posterior do acetábulo e é composto pelo corpo, a espinha isquial, os ramos isquiais superior e inferior e a tuberosidade isquiática formada pela sua margem posteroinferior.

Púbis – forma a porção mais anterior da bacia e do acetábulo e funciona como uma âncora para o movimento de torção do tronco e adução da coxa. Na margem anterossuperior do corpo do púbis encontra-se uma área de espessamento arredondado, a crista púbica, que se estende lateralmente como o tubérculo púbico (sítio de inserção do ligamento inguinal). O púbis é composto pelo corpo (localizado medialmente) e os ramos superior (estende-se lateralmente a partir do corpo para formar parte do acetábulo) e inferior (projeta-se em direção ao ísquio). O púbis e o ísquio formam os limites do forame obturador. O ramo isquiopúbico é o limite inferior do forame obturador, formado pelos ramos inferiores do ísquio e do púbis (figura 8).

Figura 7: Representação esquemática usando reconstruções tomográficas 3D da bacia mostrando o osso inominado (em laranja), formado pela união de 3 ossos: o ílio (em azul), o púbis (em amarelo) e o ísquio (em rosa), após a fusão da cartilagem trirradiada (representada pela linha tracejada branca). O púbis e o ísquio formam os limites do forame obturador.


Figura 8: Representação esquemática 3D da bacia mostrando os reparos anatômicos relacionados ao púbis: o corpo e seus ramos superior e inferior, a crista e o tubérculo púbicos. O ramo isquiopúbico é formado pela junção do ramo inferior do púbis e do ramo isquial.


A margem medial do corpo do púbis se articula com o púbis contralateral através da sínfise púbica.


A sínfise púbica é classificada como uma articulação não-sinovial anfiartrodial (anfiartrose), ou seja, recoberta por cartilagem hialina com cerca de 1 a 3 mm de espessura, porém separada por um disco fibrocartilaginoso (articulação cartilaginosa secundária) – para maiores detalhes sobre os diversos tipos de articulação veja a página CLASSIFICAÇÕES / OUTROS.

A mobilidade da sínfise púbica é pequena, geralmente até 3° de rotação durante a marcha e 2 mm no sentido craniocaudal, mas pode ser de 2 a 3 mm maior nas mulheres, podendo chegar a 8-10 mm na gravidez.

O disco fibrocartilaginoso interpúbico se une às estruturas ligamentares e à aponeurose conjunta do adutor longo e do reto abdominal e serve para absorver e dissipar as forças compressivas axiais e de cisalhamento na sínfise púbica. É mais largo nas mulheres, enquanto que a extensão vertical da sínfise é maior nos homens.

Há uma fina fenda no interior do disco fibrocartilaginoso, denominada “fenda primária”, que pode ser preenchida por pequena quantidade de líquido e é um achado fisiológico.

A sínfise púbica não possui cápsula articular verdadeira, sendo estabilizada pela superfície articular, os ligamentos púbicos e pelo balanço dinâmico das inserções miotendíneas dos adutores e músculos da parede abdominal.

A aponeurose conjunta do reto abdominal - adutor longo se insere no púbis anteriormente e se interlaça com ligamentos da sínfise e o disco fibrocartilaginoso subjacente e tem importante papel biomecânico e fisiopatológico. Alterações ósseas na sínfise púbica frequentemente estão associadas a lesões na aponeurose conjunta do reto abdominal - adutor longo, que também estão implicadas na etiologia da osteíte. E, nos pacientes que apresentam lesões miotendíneas, cerca de 50% apresentam edema ósseo no púbis.

Avaliação da sínfise púbica por imagem

O RX é útil para avaliar principalmente as alterações degenerativas e a instabilidade púbica, assim como a presença de esclerose, entesófitos, avulsão óssea e calcificações periarticulares. A rotina de avaliação inclui a incidência anteroposterior da bacia em ortostatismo e a incidência de flamingo – radiografias localizadas da sínfise púbica na incidência anteroposterior realizadas com apoio monopodálico alternado para avaliação da instabilidade vertical da sínfise (figura 9). Essa posição com apoio de apenas um dos pés causa rotação anterior do sacro e posterior do ílio, com o lado em que foi retirada a carga sofrendo menos estresse em comparação com o lado do apoio.


Figura 9: Incidência de flamingo da sínfise púbica, inspirada na posição habitual da ave homônima que costuma ficar com um dos pés elevados (9a), em que são obtidas imagens com apoio monopodálico alternado: uma imagem localizada do púbis com o pé direito elevado (9b) e outra com o pé esquerdo elevado (9c) para comparação da mobilidade da sínfise. Neste caso observa-se pequena elevação da margem direita do púbis (seta branca) com a elevação do pé contralateral.

A instabilidade da sínfise púbica é definida como desvio vertical > 2 mm ou alargamento > 7 mm nas radiografias na incidência de Flamingo. Entretanto, esses achados podem ser encontrados em atletas assintomáticos, devendo ser valorizados de acordo com o quadro clínico. Para maiores detalhes sobre valores normais e a mensuração da diastase da sínfise púbica veja a página NOTAS & MEDIDAS / QUADRIL.

A tomografia computadorizada também avalia bem as alterações degenerativas, esclerose, entesófitos e avulsão óssea, apresentando maior acurácia na detecção das calcificações periarticulares, sendo útil na suspeita de tendinopatia cálcica.

A ultrassonografia, quando realizada por profissionais experientes, consegue identificar deficiência da parede posterior do canal inguinal, diagnosticada quando há aumento na área seccional do canal inguinal comparativamente ao repouso na manobra de Valsalva, lesões no ligamento inguinal e a presença de hérnia inguinal quando há protrusão de gordura e/ou alça intestinal através do anel inguinal profundo ou por um defeito na parede posterior do canal inguinal. Embora o ultrassom não penetre a córtex óssea, achados na superfície podem ser identificados, como irregularidades nas margens da sínfise e esporões, assim como é possível identificar a diastase da sínfise púbica. Quanto às lesões da aponeurose comum do reto abdominal - adutor longo que costumam estar associadas, a especificidade costuma ser alta, porém é bem menos sensível em comparação com a RM.

A RM é o exame de escolha no diagnóstico da osteíte púbica, identificando o edema ósseo no púbis, que pode estar ou não associado a alterações nas partes moles adjacentes, e excluindo outras alterações.

O ideal é que o exame seja realizado com protocolo específico para sínfise púbica, e não apenas a RM de rotina da bacia. Para melhor orientação sobre o protocolo sugerido para os exames da sínfise púbica veja a página PROTOCOLOS / BACIA & QUADRIL.

O sinal mais precoce de osteíte púbica é o edema ósseo difuso subarticular nas margens da sínfise, tipicamente bilateral. Nos casos avançados são observados periostite, reabsorção óssea, cistos subcondrais e osteofitos.

Em 2012 foi proposta uma classificação da osteíte púbica por Krüger levando em consideração dos achados na RM com a duração do quadro clínico (tabela 3).

Tabela 3: Classificação de Krüger da osteíte púbica.

Uma forma quantitativa de avaliar o edema ósseo na sínfise púbica foi descrita por Gaudino e cols., em que é posicionado um ROI com cerca de 10 a 15 mm² na região de maior sinal do edema ósseo na ponderação STIR no plano transversal e um ROI similar no músculo psoas homolateral. Dessa forma, é possível estabelecer uma relação entre as medidas da intensidade do sinal entre o psoas e a área do edema ósseo, caracterizando o edema como mais ou menos acentuado caso a relação seja maior ou menor que 3, respectivamente. Esse dado pode ser utilizado como estimativa do tempo necessário para a recuperação, o que pode ser útil principalmente nos casos dos atletas profissionais, conforme preconizado pelos autores (figura 10).


Figura 10: Relação entre a avaliação quantitativa do edema ósseo e outros achados na RM e o tempo de recuperação da osteíte púbica em 18 meses segundo Gaudino e cols.


Diagnóstico diferencial da osteíte púbica

Os diagnósticos diferenciais mais importantes ao se identificar edema ósseo no púbis que devem ser excluídos são:


Apofisite púbica – a ossificação e fusão dos centros de ossificação do púbis costuma ocorrer até os 21 anos de idade. Sailly e cols. descreveram 4 formas de maturação da sínfise púbica em adolescentes a adultos jovens (figura 11):

Estágio 1 – apófise aberta; não há ossificação dos centros secundários

Estágio 2 – apófise aberta, com ossificação dos centros secundários

Estágio 3a – apófise fechada (fusionada), sem sinais dos centros de ossificação secundários

Estágio 3b – apófise fechada, com centros de ossificação secundários remanescentes



Figura 11 (a-d): Imagens tomográficas no plano transversal, modificadas de Sailly M e cols. Br J Sports Med. 2015 Jun;49(12):828-34 mostrando os estágios de maturação da sínfise púbica em adolescentes a adultos jovens: estágio 1, caracterizado pela apófise aberta e sem centros de ossificação secundários (11a), estágio 2, com apófise aberta e centros de ossificação secundários visíveis (setas amarelas na figura 11b), estágio 3a, em que a apófise está fusionada, sem sinais dos centros de ossificação secundários (11c) e estágio 3b, em que a apófise está fusionada, com centros de ossificação secundários remanescentes (11d).

Pacientes jovens expostos a atividades esportivas com alta sobrecarga mecânica sobre a sínfise púbica ainda em desenvolvimento podem ter a sua maturação prejudicada.

Espondiloartrite axial – a sínfise púbica é um local de potencial acometimento da espondiloartrite axial, com achados radiográficos semelhantes aos encontrados nas articulações sacroilíacas (erosão subcondral, esclerose e anquilose) em 47% dos casos. Segundo Kang et al., foram encontradas alterações inflamatórias na sínfise púbica em 18% dos pacientes com diagnóstico de espondiloartrite axial submetidos a RM da região pélvica e estão associadas a idade em torno dos 40 anos e níveis elevados de proteína C reativa e VHS. Os achados mais comuns são edema ósseo subcondral e subjacente às enteses nas margens anteroinferior ou posterior da sínfise púbica e entesite, principalmente nas inserções dos adutores e, mais raramente, do reto abdominal e pectíneo. História familiar positiva e associação com dor lombar persistente e rigidez matinal aumentam o grau de suspeição clínica para espondiloartropatias soronegativas.

Osteomielite – a osteomielite no púbis ocorre com mais frequência em pacientes submetidos a procedimentos invasivos na pelve, em especial na próstata (biópsias e cirurgias). Entretanto, pode ocorrer de forma espontânea nos atletas com quadro clínico muito semelhante à osteíte púbica. A apresentação tende a ser mais aguda e a leucocitose costuma ser leve.

LEITURA SUGERIDA

Zuckerbraun BS, Cyr AR, Mauro CS. Groin Pain Syndrome Known as Sports Hernia: A Review. JAMA Surg. 2020 Feb 5. doi: 10.1001/jamasurg.2019.5863.

Varada S, Moy MP, Wu F, Rasiej MJ, Jaramillo D, Wong TT. The prevalence of athletic pubalgia imaging findings on MRI in patients with femoroacetabular impingement. Skeletal Radiol. 2020 Mar 6. doi: 10.1007/s00256-020-03405-z.

Massa J, Vanstraelen F, Bogaerts S, Peers K. Prevalence of asymptomatic radiological findings in the groin region: a systematic review. Phys Sportsmed. 2020 Mar 26:1-7. doi: 10.1080/00913847.2020.1746209.

Palmer W, Bancroft L, Bonar F et al. Glossary of terms for musculoskeletal radiology. Skeletal Radiol (2020). https://doi.org/10.1007/s00256-020-03465-1.

Akgün AS, Agirman M.J Association between cam-type femoroacetabular impingement and osteitis pubis in non-athletic population on magnetic resonance imaging. Orthop Surg Res. 2019 Oct 22;14(1):329. doi: 10.1186/s13018-019-1368-6.

Todeschini K, Daruge P, Bordalo-Rodrigues M, Pedrinelli A, Busetto AM. Avaliação por imagem do púbis em jogadores de futebol.Rev Bras Ortop 2019;54:118–127.

Zoland MP, Iraci JC, Bharam S, Waldman LE, Koulotouros JP, Klein D. Sports Hernia/Athletic Pubalgia Among Women. Orthop J Sports Med. 2018 Sep 14;6(9):2325967118796494. doi: 10.1177/2325967118796494.

Sports Health. 2017 Sep/Oct;9(5):428-435. doi: 10.1177/1941738117694841.

Gaudino F, Spira D, Bangert Y, Ott H, Beomonte Zobel B, Kauczor HU, Weber MA. Osteitis pubis in professional football players: MRI findings and correlation with clinical outcome. Eur J Radiol. 2017 Sep;94:46-52. doi: 10.1016/j.ejrad.2017.07.009.

Matikainen M, Hermunen H, Paajanen H. Athletic Pubalgia in Females: Predictive Value of MRI in Outcomes of Endoscopic Surgery. Orthop J Sports Med. 2017 Aug 3;5(8):2325967117720171. doi: 10.1177/2325967117720171.

Betfiang M. Flamingo Stress View of the Pelvis. Radiol Technol May/June 2017 88:562-563.

Morley N, Grant T, Blount K, Omar I. Sonographic evaluation of athletic pubalgia. Skeletal Radiol. 2016 May;45(5):689-99. doi: 10.1007/s00256-016-2340-8.

Weir A, Brukner P, Delahunt E, Ekstrand J, Griffin D, Khan KM, Lovell G, Meyers WC, Muschaweck U, Orchard J, Paajanen H, Philippon M, Reboul G, Robinson P, Schache AG, Schilders E, Serner A, Silvers H, Thorborg K, Tyler T, Verrall G, de Vos RJ, Vuckovic Z, Hölmich P. Doha agreement meeting on terminology and definitions in groin pain in athletes. Br J Sports Med. 2015 Jun;49(12):768-74. doi: 10.1136/bjsports-2015-094869.

Sailly M, Whiteley R, Read JW, Giuffre B, Johnson A, Hölmich P. Pubic apophysitis: a previously undescribed clinical entity of groin pain in athletes. Br J Sports Med. 2015 Jun;49(12):828-34. doi: 10.1136/bjsports-2014-094436.

Hopp SJ, Culemann U, Kelm J, Pohlemann T, Pizanis A. Osteitis pubis and adductor tendinopathy in athletes: a novel arthroscopic pubic symphysis curettage and adductor reattachment. Arch Orthop Trauma Surg. 2013 Jul;133(7):1003-9. doi: 10.1007/s00402-013-1777-7.

Beatty T. Osteitis pubis in athletes. Curr Sports Med Rep. 2012 Mar-Apr;11(2):96-8. doi: 10.1249/JSR.0b013e318249c32b. Review.

Hiti CJ, Stevens KJ, Jamati MK, Garza D, Matheson GO. Athletic osteitis pubis. Sports Med. 2011 May 1;41(5):361-76. doi: 10.2165/11586820-000000000-00000.Review.

Burkhardt JH, Arshanskiy Y, Munson JL, Scholz FJ. Diagnosis of inguinal region hernias with axial CT: the lateral crescent sign and other key findings. Radiographics. 2011 Mar-Apr;31(2):E1-12. doi: 10.1148/rg.312105129.

Omar IM, Zoga AC, Kavanagh EC, Koulouris G, Bergin D, Gopez AG, Morrison WB, Meyers WC. Athletic pubalgia and "sports hernia": optimal MR imaging technique and findings. Radiographics. 2008 Sep-Oct;28(5):1415-38. doi: 10.1148/rg.285075217.

Cunningham PM, Brennan D, O'Connell M, MacMahon P, O'Neill P, Eustace S.AJR Am J Roentgenol. 2007 Mar;188(3):W291-6. doi: 10.2214/AJR.06.0051.


Comments


bottom of page