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FRATURA DO GANCHO DO HAMATO

Patrícia Martins e Souza - Agosto de 2018

História clínica

 

Homem, 44 anos, com dor persistente na porção ulnar do punho. Solicitados ressonância magnética e tomografia computadorizada do punho:

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Figura 1 (a-c): Imagens consecutivas de ressonância magnética (RM) na ponderação DP com supressão de gordura (SG) no plano coronal.

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Figura 2: Imagem de RM na ponderação DP SG no plano sagital.

Figura 3 (a-b): Imagem de RM no plano transversal nas ponderações DP SG (3a) e T1 (3b).

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Figura 4 (a-c): Reconstruções multiplanares de aquisição tomográfica com a técnica MPR nos planos coronal (4a), sagital (4b) e transversal (4c).

Descrição dos achados

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Figura 1 (a-c)’: Imagens consecutivas de RM na ponderação DP com supressão de gordura (SG) no plano coronal mostrando edema no osso hamato (setas amarelas), mais evidente na imagem mais volar (1c’).

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Figura 2’: Imagem de RM na ponderação DP SG no plano sagital mostrando o edema no corpo (seta amarela) e no gancho do hamato (seta branca), com imagem sugestiva de traço de fratura na base do gancho do hamato (seta vermelha).

Figura 3 (a-b)’: Imagem de RM no plano transversal nas ponderações DP SG (3a’) e T1 (3b’) mostrando o edema no corpo (seta amarela) e no gancho do hamato (seta branca) na ponderação DP SG, com o traço de fratura na base do gancho do hamato (seta vermelha) melhor identificado na ponderação T1.

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Figura 4 (a-c)’: Reconstruções multiplanares de aquisição tomográfica com a técnica MPR nos planos coronal (4a’), sagital (4b’) e transversal (4c’), onde o traço de fratura e o afastamento entre os fragmentos (setas vermelhas) são bem identificados nos planos sagital e transversal.

Discussão

As fraturas do hamato correspondem a 2 a 4% das fraturas do carpo e são divididas nas fraturas do corpo e do gancho (a mais comum). As fraturas do corpo do hamato são mais raras, sendo o mecanismo mais frequente trauma com vetor de força axial (como queda, soco, acidente automobilístico e lesões por compressão), onde o eixo da força é paralelo às diáfises dos metacarpos, sendo frequente a associação com fraturas nas bases do 4o e 5o metacarpos ou luxação carpometacarpiana.

 

Tipos de fratura do corpo do hamato:

 –  Coronal, mais comum, sendo frequente a associação com subluxação carpometacarpiana (geralmente deslocamento dorsal do 4o e/ou 5o metacarpos) e fratura nas bases do 4o e/ou 5o  metacarpos.

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– Transversal, rara, geralmente relacionada a lesão por compressão.

As fraturas do gancho (ou hâmulo) do hamato geralmente decorrem de esportes que envolvem uso de raquetes e tacos (como golfe, tênis, beisebol), conforme ilustrado na figura 5, queda com a mão estendida ou microtraumas de repetição, como no ciclismo (em especial “mountain bike”).

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Tipos de fratura do gancho do hamato (figura 6):

I – ponta do gancho

II – centro (meio) do gancho (maior risco de não-união)

III – base do gancho (mais de 75% dos casos)

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Figura 5: Representação do mecanismo de fratura do gancho do hamato nos esportes que usam raquetes ou tacos (Dr. Nabil Ebraheim).

Figura 6: Tipos de fratura do gancho do hamato em relação à localização: na ponta, centro ou base do gancho.

Frequentemente as fraturas do hamato não são diagnosticadas, podendo evoluir com dor persistente e não-união (sintomática ou assintomática, identificada como achado incidental).

 

O diagnóstico radiográfico costuma ser difícil nas incidências de rotina, sendo indicada a incidência do túnel do carpo (figura 7) que dissocia o gancho do hamato, assim como o pisiforme.

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Figura 7: Radiografia na incidência do túnel do carpo mostrando bem o gancho do hamato (seta amarela) adjacente ao pisiforme (seta branca).

A tomografia computadorizada (TC) é o método de escolha para o diagnóstico das fraturas do hamato (acurácia de 97,2%).

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Recentemente foi descrito que associação entre fraturas do escafoide e do hamato são mais frequentes do que se imaginava, provavelmente porque, embora seja comum a solicitação de incidência para avaliação do escafoide, não são feitas rotineiramente incidências especificas para ao hamato, ainda mais quando já foi diagnosticada a fratura do escafoide. Com a maior utilização de TC e RM, foi observado que pode haver fratura do hamato em cerca de 10% dos casos de fratura do escafoide, informação relevante porque pode alterar o tempo de imobilização.

 

Diagnósticos diferenciais:

– Centro de ossificação não fusionado (os hamuli próprio); quando bilateral facilita o diagnóstico

– Hamato bipartido (muito raro; < 1% da população)

– Fratura do pisiforme

– Coalizão entre o pisiforme e o hamato (muito rara; geralmente assintomática, mas pode cursar com rotura do tendão flexor do 5o dedo, neuropatia ulnar ou do mediano).

 

Se o paciente não apresenta dor na porção ulnar do punho não é relevante a distinção entre sequela de fratura não consolidada e variantes anatômicas. Mas é importante informar quando o  osso hamato tem aspecto bipartido no pré-operatório da síndrome do túnel do carpo para evitar iatrogenia no nervo ulnar.

 

A ressonância magnética é útil na detecção de outras lesões associadas e complicações, como lesão do nervo ulnar e rotura do tendão flexor do 5o dedo. Para identificação dessas e outras alterações é necessária a compreensão da anatomia do canal de Guyon (figuras 8 e 9), formado por:

 

Teto – ligamento carpal palmar e músculo palmar curto

Assoalho – musculatura hipotenar e retináculo dos flexores profundos (conhecido também como ligamento carpal transverso)

Margem radial (lateral) – gancho do hamato

Margem ulnar (medial) – pisiforme e ligamento pisohamato

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Figura 8: Reconstrução tomográfica com a técnica MIP mostrando a região do canal de Guyon (asterisco vermelho) entre os ossos hamato (H) e pisiforme (P).

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Figura 9: Imagens consecutivas de RM na ponderação T1 no plano transversal, mostrando a anatomia do canal de Guyon (seta vermelha), espaço entre os ossos hamato (H) e pisiforme (P), que contém gordura e o nervo ulnar (setas azuis), que no seu trajeto mais distal encontra-se adjacente ao gancho do hamato (G). A artéria e a veia ulnar (em destaque no círculo amarelo) se situam em situação volar ao nervo ulnar. Pir – piramidal.

O nervo ulnar e o tendão flexor do 5o dedo são estruturas próximas ao gancho do hamato, sendo susceptíveis a lesões quando há fratura (figura 10).

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Pontos principais neste caso:

 

- Fraturas do corpo e do gancho do hamato têm mecanismos de trauma diferentes, esta última frequentemente associada a esportes.

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- Comum fratura do hamato ser oculta ao RX, necessitando de incidências especiais, sendo a TC o método de escolha. Importante sempre avaliar cada estrutura nos 3 planos.

​

- Sempre procurar ativamente fratura do hamato nos casos de com fratura do escafoide, pois pode ter associação em 10% dos casos e altera a conduta.

​

- Importante informar quando o  osso hamato tem aspecto bipartido no pré-operatório da síndrome do túnel do carpo para evitar iatrogenias.

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- Procurar ativamente sinais de lesão do nervo ulnar e rotura do tendão flexor do 5o dedo.

LEITURA SUGERIDA

Concomitant hook of hamate fractures in patients with scaphoid fracture: more common than you might think. Mandegaran R, Gidwani S, Zavareh A. Skeletal Radiol 2018; 47: 505–510. doi.org/10.1007/s00256-017-2814-3.

 

Hook of the Hamate: The Spectrum of Often Missed Pathologic Findings. Davis DL. AJR 2017 November; 209(5): 1110–1118. doi:10.2214/AJR.17.18043.

 

Subtle radiographic signs of hamate body fracture: a diagnosis not to miss in the emergency department. Cecava ND, Finn MF, Mansfield LT. Emerg Radiol (2017) 24: 689. doi.org/10.1007/s10140-017-1523-5.

​

Pulling Harder than the Hamate Tolerates: Evaluation of Hamate Injuries in Rock Climbing and Bouldering. Lutter C, Schweizer AHochholzer TBayer TSchöffl V.Wilderness Environ Med. 2016 Dec;27(4):492-499. doi: 10.1016/j.wem.2016.09.003.

 

Carpal Bone Fractures. Papp S. Orthopedic Clinics of North America 2007; 38(2):251–60. doi:10.1016/j.hcl.2009.08.014.

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