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EXTRUSÃO DISCAL CERVICAL TRAUMÁTICA

Patrícia Martins e Souza - Novembro de 2018 

História clínica

 

Mulher, 63 anos, com dor na região cervical após acidente automobilístico. Solicitada ressonância magnética (RM) da coluna cervical:

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Figura 1 (a-b): Imagens de RM da coluna cervical no plano sagital nas ponderações T2 (1a) e T1 (1b).

Descrição dos achados:

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Figura 1 (a-b)’: Imagens de RM da coluna cervical no plano sagital nas ponderações T2 (1a') e T1 (1b’) mostrando a ausência do disco no espaço intervertebral C6-C7 (setas brancas), onde há material com sinal elevado em T2. Identifica-se material com sinal semelhante aos discos intervertebrais posteriormente ao corpo vertebral de C6 compatível com extrusão completa do disco C6-C7, exercendo efeito compressivo sobre a medula espinhal, que apresenta discreta área de hipersinal em T2 (seta vermelha).

Há alteração de sinal nas partes moles pré-vertebrais (setas azuis) sugestivo de hematoma pelo sinal intermediário a elevado na ponderação T1.

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Figura 2: Imagem ampliada de RM da coluna cervical no plano sagital na ponderação T2 mostrando o espaço intervertebral sem o disco (seta branca), que se encontra completamente deslocado (seta amarela) e associado a alteração do sinal na medula espinhal (seta vermelha). Note também que há discreta anterolistese do corpo de C6.

Discussão

 

A herniação discal traumática é um evento raro, sendo ainda mais rara a ocorrência da extrusão completa do disco intervertebral, evento conhecido como ‘slipped disc’ (disco “escorregado”) e extrusão discal “explosiva”.

Embora incomum, a herniação discal traumática é uma ocorrência grave que, embora possa ser um achado isolado, muitas vezes está associada a fraturas, lesão ligamentar, luxação das facetas articulares (que ocorre em 54-80% dos casos) e lesão medular.

 

O mecanismo do trauma costuma ser hiperflexão violenta, com distração do espaço intervertebral e posterior realinhamento ósseo com extrusão de material discal, que pode ser incompleta ou completa.

Este caso ocorreu há quase dez anos, e nas imagens de arquivo só foram salvas as imagens sagitais mais centrais que demostravam o material discal extruso, que foi o foco principal também do relatório. Nessa época não era hábito fazer de rotina sequências sensíveis a líquido, como STIR, nem bloco volumétrico no plano transversal na coluna cervical, apenas três imagens axiais de cada espaço discal. Também não se costuma valorizar exames eletivos de coluna, que muitas vezes são realizados e liberados sem devida atenção, por tratar-se de um “exame de rotina”. E, mesmo em exames de emergência, quando o RX ou TC são considerados normais ou sem alterações que chamem atenção, muitas vezes o paciente é liberado sem que sejam checados os “sinais de alerta” de que pode haver algo mais grave nos exames de coluna cervical.

 

Autores brasileiros publicaram na Revista Chilena de Neurocirurgia relato de dois casos de hérnias traumáticas agudas associadas a mielopatia, ambos com RX e TC de admissão normais, em que um deles, com 23 anos, evoluiu com tetraplegia mesmo com tratamento cirúrgico.

 

Por isso, é importante sempre valorizar o quadro clínico de dor cervical pós-trauma e indicar RM em casos suspeitos mesmo com RX e TC aparentemente normais e buscar ativamente por sinais de alerta que podem ser sutis.

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ALGUNS SINAIS DE ALERTA NOS EXAMES DE COLUNA CERVICAL QUE PODEM ESTAR ASSOCIADOS A HÉRNIAS TRAUMÁTICAS

 

No contexto de trauma devemos ter atenção redobrada quando notarmos (figuras 3 e 4):

 

  • Alteração no alinhamento normal

  • Aumento do espaço entre os processos espinhosos

  • Deslocamento facetário

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Fig 4 a-b.jpg

Figura 3: Imagem radiográfica em perfil mostrando o alinhamento normal da coluna cervical, onde existe uma curvatura suave e um paralelismo entre a margem anterior e posterior das vértebras (linhas amarela e azul, respectivamente), margem posterior das facetas articulares (linha laanja) e margem posterior dos processos espinhosos (linha verde). Houve também perda da lordose fisiológica, com perda da curvatura suave da margem anterior dos corpos vertebrais.

Figura 4 (a-b): Imagem radiográfica em perfil e reconstrução tomográfica MPR no plano sagital da coluna cervical de paciente com subluxação das facetas de C5-C6, mostrando a perda do alinhamento normal devido a pequena anterolistese de C5 (seta branca), aumento anormal do espaço entre os processos espinhosos de C5 e C6 (seta amarela) e subluxação das facetas de C5-C6 (setas vermelhas), onde se nora que a faceta inferior de C5 recobre parcialmente a faceta superior de C6.

Pontos principais neste caso:

 

- Lesões graves da coluna cervical podem ter achados extremamente sutis ou até mesmo nada expressivo nos exames radiográficos e tomográficos.

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- E quando encontramos algum achado mais evidente, como fratura em corpo vertebral e hérnia discal devemos buscar outros achados sutis que podem indicar instabilidade evitando a armadilha conhecida como "satisfação da busca".

LEITURA SUGERIDA

Dezena RA,  Pereira CU, Araújo LP , Boullosa JLR, Silva MN. Traumatic extrusion of C5-C6 intervertebral disc associated to mielopathy without bone lesion: Report of 2 cases and review. Rev. Chil. Neurocirugía 40: 49-52, 2014.

 

O'Shaughnessy J, Grenier JM, Stern PJ. A delayed diagnosis of bilateral facet dislocation of the cervical spine: a case report. J Can Chiropr Assoc. 2014;58 (1): 45-51.

 

Ebraheim N, Patil V, Liu J, Haman S, Yeasting R. Morphometric analyses of the cervical superior facets and implications for facet dislocation. International Orthopaedics. 2008;32:97-101.

 

Zmurko MG, Tony Y. Tannoury TY, Chadi A. Tannouryb CA, Anderson DG. Cervical sprains, disc herniations, minor fractures, and other cervical injuries in the athlete. Clin Sports Med 2003; 22: 513-521.

 

Takahashi M, Harada Y, Inoue H, Shimada K. Traumatic cervical cord injury at C3-4 without radiographic abnormalities: correlation of magnetic resonance findings with clinical features and outcome. J Orthop Surg (Hong Kong) 2002; 10: 129-135.

 

Hayes KC, Askes HK, Kakulas BA. Retropulsion of intervertebral discs associated with traumatic hyperextension of the cervical spine and absence of vertebral fracture: an uncommon mechanism of spinal cord injury. Spinal Cord 2002; 40: 544-547.

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